O ‘milagre’ e o CFM
Ontem assisti estupefato à uma matéria no fantástico sobre um atropelamento ocorrido em Anápolis, Goiás... Trata-se de um acidente raro e impressionante, resultado da sequência de duas batidas... Um carro colide com a traseira de outro que por sua vez perde o controle de choca-se com um terceiro carro que está estacionado... Este último veículo move-se em direção à uma senhora que caminha na calçada com o netinho... O carro atropela os dois passando com uma das rodas dianteiras sobre o menino de 5 anos, em uma linha diagonal entre a clavícula e o pescoço do menino, e raspando a região da orelha e do queixo... O menino sai ileso do acidente...
O assunto foi tratado de forma apologética, terrível, envolvendo um dito 'perito' em acidentes e um 'médico' ortopedista:
1. Do 'Perito':
"A pedido do Fantástico, um perito em acidentes calculou velocidade e força do impacto com que o carro branco atingiu o menino. Para isso, analisou: a distância entre os carros antes da batida, de 19 metros; a distância percorrida pelo carro branco com o impacto, de 15 metros; Segundo as contas do perito, o carro atingiu o menino a 39 km/h."... O cálculo está ERRADO!!! Ele não considera as importantes ‘absorções de impacto’ ocorridas nas duas colisões, e visivelmente a velocidade é bem menor do que quase '40km/h'... Esta premissa é inteiramente falsa!!!
O ‘perito em acidentes’, Renato Orsi, afirma que: “comparativamente, você pega esse carro que tem 932 quilos aproximadamente sobe ele 6 metros, são dois andares de um edifício, coloca o carro na ponta e solta. É bastante intenso”... Isso é ridículo, ignóbil e tendencioso!!!
(1) Primeiro por que no acidente o carro ‘rola’ por cima do pescoço do menino, e não 'cai sobre o menino'... Existe, portanto, uma ‘rolagem’ com o peso distribuído e não um ‘esmagamento’ com todo o peso...
(2) Depois porque o peso do carro está distribuído por seus 04 pneus, sendo que a deformação do ‘pneu’ também absorve parte da força que não é transferida para o menino...
(3) Mas, finalmente, tudo isso é ridículo porque no caso de ter o veículo de “932 quilos” solto do segundo “andar de um edifício”, o menino receberia ‘todo’ o impacto, além de ser ‘esmagado contra o solo’ - o que é infinitamente diferente de receber uma ‘rolagem’ com uma zona de escape, recebendo apenas ¼ da força, considerando a respectiva e ‘importantíssima’ absorção promovida pela deformação do pneu...
(4) Mas o peso ainda foi bem menor, e isso por vemos que a roda traseira do veículo desce a calçada, o que acarreta no alívio do peso sob as rodas dianteiras, e em especial a roda que ‘rola’ sobre o pescoço do menino...
2. Do Médico e da Competência do CFM:
"João fez radiografias da coluna cervical, bacia e tórax. O médico não encontrou nenhum arranhão."... Um ortopedista deveria esperar fraturas e fissuras em suas radiografias, e não arranhões, mas notei claramente, pela entrevista, que ele utilizava termos pouco 'médicos' e abusava de expressões 'piegas', deixando antever claramente qual seria o gran finale...
O 'médico' ortopedista Juliano Martins considerou as características anatômicas e fisiológicas pertinentes à um garoto de 5 anos, com ossos e ligamentos mais flexíveis, mas arrematou que: "No entanto, não tenho dúvidas de que isso foi um milagre”...
Como é possível que formemos MÉDICOS QUE AINDA ACREDITEM EM MILAGRES??? O que faríamos com engenheiros que acreditassem em milagres, aliviando nos cálculos estruturais de suas pontes??? Ou engenheiros que, acreditando em milagres, aliviassem no cálculo estrutural de protensões contra descargas atmosféricas, se ATÉ AS IGREJA TÊM PARA-RAIOS???
E é interessante notar que MAIS MILAGRES OCORREM NO 'EINSTEIN' OU NO 'SÍRIO-LIBANÊS', SENDO PATENTE QUE DEUS NÃO ATENDE PELO 'SUS'... O Conselho Federal de Medicina deveria estar atendo a casos como esse... Como o médico grastroenterologista e 'pator', Dr. Robalinho, que atendeu a minha esposa 'grávida' e receitou um tratamento fortíssimo contra gastrite... Na saída tivemos ou seguinte diálogo:
Dr. Robalinho: - Se 'deus' quiser ela ficará bem.
Autor: - Como assim 'deus'?
Dr. Robalinho: - Claro! O médico é guiado por 'deus'.
Autor: - Mas como eu não acredito em 'deuses', em 'nenhum deles', então peço para não pagar a 'parte de deus' na consulta!
Dr. Robalinho: - Mas eu só utilizei procedimentos científicos!
Autor: - Então onde entra o 'seu deus'?
Dr. Robalinho: - Foi como desejar 'boa sorte'.
Autor: - Mas não foi isso o que você disse... Eu já entendi, vou pagar a consulta... Ou posso apenas dizer: 'deus lhe pague'? É uma de desejar 'boa sorte'!
"QUANDO ALGUÉM DEFENDE COM 'ARGUMENTOS DE OCASIÃO' O QUE AFIRMA PROFESSAR POR 'RAZÕES DE PRINCÍPIO', TENDEMOS A SUSPEITAR DE QUE NA VERDADE NÃO ACREDITA FIRMEMENTE EM NENHUM DOS DOIS." - Xavier Rubert de Ventós
3. Do 'Milagre' ou 'Azar':
“Sentei aqui, fiquei, aí ele deitou aqui no chão, falou: ‘vovó eu vou descansar um pouquinho’. Estava uma sombra boa. Aí ele falou: vamos embora vovó? Eu falei: ‘então vamos’.”... QUE AZAR!!! Ao invés de sair do descanso alguns segundos antes ou depois, O MENINO AZARADO DECIDIU CAMINHO AO ENCONTRO DO ACIDENTE EXATAMENTE NO MOMENTO DA COLISÃO...
E tem mais, SE ASSUMIMOS QUE DEUS PODE INTERFERIR CONSAGRANDO MILAGRES, PODEMOS ENTÃO ASSUMIR QUE ELE NÃO INTERFERIU CAUSANDO A MORTE DE MUITAS OUTRAS CRIANÇAS, IDOSOS E ADULTOS... Trata-se do desonesto truque de JOGAR TÊNIS SEM REDE...
SE DEU CERTO FOI DEUS, SE DEUS ERRADO FODEU!!!
PENSEM, SE DEUS É RESPONSÁVEL PELA CURA, POR QUE NÃO IMPEDIU A ENFERMIDADE???
Existe ainda o famoso desvio cognitivo de confirmação... As nossas 'crenças' precedentes as explicações 'racionais' para crer... Primeiro abraçamos a crença, e depois tratamos de explicá-las, seja por meio de 'falsos peritos', e de 'ortopedistas de deus'...
Há alguns anos, um homem ganhou na loteria nacional espanhola com um bilhete que terminava com o número '48'... Orgulhoso de seu "feito", ele revelou a 'superstição' que o teria levado à fortuna:
"Sonhei com o número 7 por 7 noites consecutivas, e 7 vezes 7 é 48."
Isso foi dito na televisão, e em cadeia nacional... Basta um rudimentar domínio da tabuada para gargalhemos do erro cometido... Mas todos nós inventamos criamos um olhar próprio sobre as nossas superstições... As superstições alheias são torpes, mas as nossas são 'lícitas'... Lutamos desesperadamente para encontrar ordem no caos, e empregamos os nossos parcos recursos para filtrar e processar as nossas percepções, extraindo significados esdrúxulos do oceano de dados que inunda a nossa vida diária... E cometemos erros que, ainda que menos óbvios, são tão significativos quanto esse...
Triste destino daqueles que nada sabem sobre a 'Probabilidade e Estatística', triste destinos daqueles que nada sabem sobre o Universo que nos cerca e sobre a Vida... Triste destino dos acéfalos em cristo...
QUEM NADA SABE EM TUDO CRÊ!!!
Carlos Sherman
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