Qual das duas torres está mais inclinada??? Nenhuma das duas, são fotos idênticas... Trata-se de uma ilusão de ótica... Uma entre tantas... |
Inventamos a Ciência para testar a nossa lucidez...
Aquilo em que quero acreditar pelas emoções, e aquilo em que devo acreditar pelas evidências, nem sempre coincidem. Sou cético, não porque não queira acreditar, mas porque quero saber. – Michael Shermer
A mente do homem está longe de ser da natureza clara e uniforme de um vidro, no qual os raios das coisas se refletem de acordo com a sua precisa incidência. Ao contrário, ela é como um espelho encantado, cheia de superstição e impostura, se não for liberada ou diminuída. – Francis Bacon, Novum Organum, 1620
A Inteligência é a medida de nossa capacidade em reconhecer padrões...
Vejam a força da ilusão – neste caso, de ótica: Galileu, o pai da Ciência Moderna – se é que houve uma Ciência Antiga – descreveu Saturno em seu rudimentar telescópio como ‘três estrelas juntas’... Faltavam-lhe melhores instrumentos de observação e uma teoria para especular sobre os anéis... O que via eram três borrões de luz, sendo um maior ao centro, e dois menores, um de cada lado, que pareciam-se com esferas... Hoje, podemos atestar sobre os anéis de Saturno, sem imprecisões óticas, de forma límpida e clara, e sabemos que seus anéis estão conformados por detritos que gravitam em torno do planeta, e sem direito à relativismos de ocasião... Chegamos ao fundo desta questão...
Nos anos 90, a série de televisão “Arquivo X” estava com tudo; confrontando o ceticismo de Scully com as crendices de Fox Mulder – o personagem principal... Mulder protagonizava o zeitgeist da época, em slogans como ‘quero acreditar’, ‘a verdade está lá fora’... Pegando carona no famoso clássico dos céticos do Pink Floyd: ‘is there anybody out there?’... Parece que não... Ainda não... Mas chegaremos lá... Isso porque, estatisticamente, é bem provável que exista vida no Universo, e bem aqui na Via Lactea... Estimamos que existam entre 700 e 900 planetas com chance de reunir as condições contingentes para a vida... Somente na nossa vizinhança... Embora ‘vizinhança’ aqui seja um conceito pra lá de exagerado... Os possíveis planetas em condições de abrigar a vida estão na realidade – irremediavelmente, apesar de toda a ficção ou mesmo do exercício sério e consequente da futurologia – bem longe de nós... Bem longe mesmo... Encontrar vida em nossa existência será bem mais complicado do que encontrar agulhas em um palheiro... Será mais parecido com encontrar grãos de açúcar no Saara... Mas estamos correndo atrás...
O cabo de guerra psicológico, desenrolado por Scully e Mulder na série, entre ceticismo e crendice, confrontando fantasia e realidade, fato e ficção, quase sempre pendia para em favor do mistério e do sobrenatural... “Arquivo X” era tão popular que foi parodiada pelos “Simpsons” no impagável “Os Arquivos Springfield”, onde, entre outras anedotas de primeira, Homer tem um contato imediato com alienígenas na floresta - mas não sem antes emborcar uma dúzia de garrafas de sua cerveja preferida... Ao menos nos “Simpsons”, o cabo de guerra pende para o ceticismo, e de forma muito bem humorada e inteligente... Tão inteligente que Leonard Nimoy, o inesquecível – e cético - “Dr. Spoke”de “Jornada nas Estrelas”, foi convidado para narrar a introdução... Nimoy já fizera isso em um seriado científico, portanto não ficcional “In Search Of”, nos anos 70... Nimoy acerta no tom e dispara: ‘A história de encontros com alienígenas que vocês vão ver agora são verdadeiras. E por verdadeiras quero dizer falsas. É tudo mentira. Mas são mentiras que divertem e, no fim, não é essa a genuína verdade? A resposta é NÃO’... Sim Nimoy, a superstição não diverte... A verdade insiste, resiste, persiste, e penetra... Mesmo que custe algum tempo... Mesmo eu custem algumas vidas, cabeças, corpos queimados...
O relativismo da verdade e a cultura pop, a velocidade da mídia de massa, faz com que os intervalos de atenção sejam medidos em minutos... Citando Shermer, tudo isso acaba por deflagra um ‘atordoante conjunto de alegações’ sobre o que seja a verdade... Tal fenômeno, a crença na crença, pode ser medido em unidades de ‘infonimento’ – ou seja, informação e entretenimento, inteligente conceito proposto por Shermer... Experimente parar diante de uma banca de jornais, e verá que as publicações ditas ‘esotéricas’ estarão estampadas em flagrante destaque, contra o pano de fundo do besteirol das revistas de fofoca... Espiritismo, Parapsicologia, Cristais, Homeopatia, Florais de Bach, Astrologia, Quiromancia, Tarô, Acupuntura, Quiropraxia, Psicologia Multifocal, Multidimensional, Gurus, Misticismo Indiano, etc e tal... Não haverão, sem exceção, revistas científicas em primeiro plano, jamais... Os tabloides se sobreporão, também, ao jornais mais sérios... Em uma livraria, faço o intento, proliferarão livros inconsequentes sobre auto-ajuda, espiritismo, misticismo, ‘freudianismo’, ‘paulo-coelhismo’, anjos, demônios, bruxas, vampiros, lobisomens, fantasmas e afins, sobre qualquer outro tema... Na televisão, navegamos entre os canais pentecostais e evangélicos, e o ôba-ôba do sobrenatural, “Supernatural”, “Lost”, “Além da Imaginação”, “Poltergeist”, “Espíritos”, “Zeitgeist”, “Quinta Dimensão”, “Isto é Incrível”, “O Sexto Sentido”, magia, mitos, monstros, super-heróis, fantasia, fantasia, fantasia, e fantasia... Trilha sonora melodramática, apagam-se as luzes, a fonte de luz provém de baixo, o rosto do apresentador é iluminado, luz e sombras, e a voz sai gutural e amedrontadora: “Não confie em ninguém. A verdade está lá fora. Quero crer. Quero ver.”... Não, a resposta reside em nossa tendência ao auto-engano, vívida em nossos cérebros... A ilusão proveniente de nossos mecanismos neurais para o reconhecimento dos padrões que regem a vida... Não induza a sua mente, auto-induzida, a crer... Queira saber... Se for capaz...
Inventamos a ciência para testar a nossa lucidez, assim como os nosso delírios...
Em 2009, uma pesquisa realizada pelo Instituto Harris, entrevistou 2.303 americanos sadios e adultos e pediu que indicassem ‘sim ou não’ para tudo aquilo em que acreditassem... Pois bem, 82% acreditam em deus, 76% em milagres, 75% na existência do ‘céu’ ou ‘paraíso’, 73% acreditam que o tal ‘Jesus’ é mesmo ‘o filho de deus’ – o deus judaico-cristão-islâmico -, 72% acreditam em anjos, 71% em alma, 70% na ressurreição do tal filho de deus, ‘Jesus’, 69% no demônio, mas 61% em inferno, também 61% na virgindade da ‘mãe’ de ‘Jesus’, filho de ‘deus’ – muito embora jamais engolíssemos uma estória dessas, seja para entender a gravidez de uma filha, ou de sua namorada ‘virgem’... A Teoria da Evolução tem apenas 45% de aceitação, isso em 2012, enquanto 42% acreditam em fantasmas... Apenas 40% acreditam piamente no ‘criacionismo’ - ou seja, o tal deus dos 82% criou tudo com um passe de mágica... Estranho se considerarmos que a única fonte da existência de deus – embora anedótica – é a bíblia, ou seja, o mesmo livro que afirma ser este deus, responsável por haver criado tudo o que existe – menos ele mesmo, que continua sendo um mistério para crentes e não crentes... 32% acreditam em OVNIs, 26% em astrologia, 23% em bruxas, e 20% em reencarnação... Shermer notou que mais pessoas acreditam em anjos e demônios do que na Evolução... Esta é a realidade americana... Presumo, e temo, que este atraso em relação a outros países ‘economicamente’ desenvolvidos, esteja relacionado com o famoso Julgamento do Macaco, em 1925, onde um professor do Tennessee foi condenado por ensinar a Evolução, sendo sentenciado a pagar um vultosa quantia, para a época, de USD 100,00... Mas o dano maior viria a seguir, quando a Evolução de Darwin foi banida dos livros escolares por quase 30 anos... Quando a Evolução retornou ao ensino americano na década de 60, foi obrigada a conviver por mais 20 anos ao lado do ‘criacionismo’, até que a inteligência prevaleceu... Mas não sem antes lutar e lutar contra o fanatismo evangélico, pentecostal e neo-pentecostal do Cinturão Bíblico americano...
Mesmo sem a mácula do Julgamento do Macaco, os britânicos – 1.066 deles –, compatriotas de Darwin, também inspiram muita preocupação, como mostra uma pesquisa do Reader´s Digest de 2006... 43% dos entrevistados declararam serem capazes de ler a mente de outras pessoas, mais de 50% disseram haver tido sonhos ou premonições sobre acontecimentos ou fatos que acabaram ‘realmente’ acontecendo... Mais de 2/3 alegaram possuir o poder de saber que alguma pessoa estava olhando para eles, fora de seu campo de visão – consultar ‘visão periférica’ -, 26% pressentiram que uma pessoa próxima estava doente, em perigo ou morrendo naquele instante – e passaram um ‘tchau’... Mas 62% disseram que podem ‘adivinhar’ que está ligando antes de atender o telefone – basta um identificador de chamadas, rsrsrsrsrs... 20% afirmou haver visto fantasmas, e 1/3 afirmaram que experiência ditas de ‘quase morte’, são uma prova irrefutável de que existe vida depois da morte...
A Fundação Nacional da Ciência (NSF) dos Estados Unidos, alarmada com estes dados, também empreendeu pesquisas e trouxe à tona mais informações... A crenças – por exemplo – em percepção extra-sensorial cai de 65% em egressos do ensino médio para 60% em egressos do ensino superior... A crença em terapias magnéticas cai de 71% para 55%, mas a crenças nas dita ‘medicina alternativa’ sobre de 89% para 92%... Parte desta situação dramática decorre do fato e do dado, de que 70% dos americanos nada sabem sobre o Método Científico – análise de probabilidades, métodos experimentais, teste de hipóteses... Portanto, parafraseando Shermer, a soluçaõ pode estar em ensinar primeiro ‘como’ a ciência funciona, além de apontar apenas ‘o que’ a ciência conhece... Ensinamos ‘o que’ pensar, ao invés de ‘como’ pensar...
Costumo elucidar, ou tentar elucidar, esta questão explicando que a ‘Ciência’ nada mais é do que ‘o ato de tornar-se ciente‘... Uma lacuna profunda é o ensino da Lógica e da Retórica, e suas subsequentes ‘falácias retóricas’... Se faz ‘mister’ e urgente ensinar a PENSABILIDADE... Antecipar o ensino da Filosofia – não enciclopédia, nem meramente histórica, mas o exercício do escrutínio da razão sobre a ‘pensabilidade’ – pode ajudar, e muito... Mas não é só isso... 53% dos americanos com alguma iniciação científica demonstram compreender o Método Científico, contra 38% no nível médio, e apenas 17% no nível básico... Portanto, ensinar ‘como’ a ciência funciona e não apenas ‘o que’ a ciência descobriu, ode ajudar muito...
Recorrentemente, percebo que certas pessoas – muitas, na realidade – se apresentam como sendo ‘ilibadamente’ científicas, mas na realidade são presas fáceis do próprio sensacionalismo científico, que fatalmente descambará para o sensacionalismo ‘pseudo-científico’... Notadamente desconhecem a argumentação lógica e retórica, desconhecem os rudimentos do Método Científico, e seus derivativos em cada área do conhecimento humano, mas estão interessados em pesquisas de ponta, ‘universos paralelos’, ‘teoria das cordas’, ‘buraco de minhoca’, etc... Este é um clássico em páginas ateístas ou ditas ‘científicas’...
Primeiros surgem as crenças, depois as explicações – Michael Shermer...
As pessoas creem porque estão aparelhadas para tal, em virtude da própria evolução... Evoluímos lentamente, em termos fisiológicos, e rapidamente em termos ‘culturais’... O nosso cérebro tem variado pouco ao longo de milhões de anos, enquanto a nossa habilidade em usá-lo caminha a passos largos... Estima-se que estejamos avançando 3 pontos de QI a cada década... Assumimos uma progressão avassaladora de desenvolvimento, e o aprendizado humano parece ir ao encontro de uma curva exponencial... E quem sabe do que seremos capazes... Quem viver verá... O grande divisor de águas no entanto, esteve na capacidade de acumular conhecimento ‘extra-corporal’, fora de nosso cérebro – mortal, temporal -, e isso foi conseguido com a evolução da escrita – em substituição ao registro iconográfico... Depois veio a revolução em termos de materiais, de pedras, placas de argila, papiros, a disquetes, CDs, DVDs, Blu-Ray, e ‘ao infinito e além’ – BuzzLightyear... o processo de reconhecer padrões, nos levou da selva aos arranha-céus, em milhares de gerações, ao longo de pouco mais de 200.000 anos... A escrita e os registros do conhecimento são bem mais recentes... A ciência, o divisor de águas entre o delírio e a lucidez, não dura mais do que alguns séculos... De forma que, em nossa saga de avidez por padrões, desenvolvemos as superstições... Registramos padrões equivocados na tentativas de descortinar os verdadeiros padrões que regem a vida...
Nesta caminho, o reconhecimento de padrões, ou ‘padronicidade’ – termos cunhado por Shermer - dois erros clássicos podem assomar... Primeiro, o Falso Positivo... ‘Acreditar’ que estamos desvendando um padrão, quando na realidade estamos criando uma nova superstição... Ou seja, ao acreditar que um fenômeno ou consequência (A) decorre diretamente ou é causado um evento (B)... Nossos antepassados viviam de relações causais simples, ordinárias, de onde uma consequência (A) provém de uma única causa (B)... Mas a vida não se comporta sempre assim, e na realidade a maioria dos fenômenos envolve múltiplas variáveis, sistemas complexos, etc.. Mas se estamos na mata, escutamos um barulho, podemos relacionar diretamente a um predador, e pernas pra que te quero... Ou pensar que foi apenas o vento... Neste tipo de situação, e dispondo de uma fração de segundos para decidir, o falso positivo, ou seja, apostar no tigre dente-de-sabres, pode ter sido uma vantagem evolutiva... Mas se considerarmos os mochicas do Perú, que acreditavam que um de seus deuses, Ai Apaec, fazia chover após algumas cabeças terem sido decapitadas, e o sangue vertido na terra para saciá-lo, podemos encontrar certas desvantagens no falso positivo... Isso porque, em parte, a extinção dos mochicas se deve à elevada mortandade de seus homens adultos e guerreiros, quando diante de uma severa estiagem ocasionada pelo fenômeno do ‘El Niño’, o número de decapitados atingiu o seu apogeu... Mas a ‘crença’ em qualquer coisa, sempre que o custo desta crença supera o custo do Falso Negativo, poderia ser vantajosa...
O Falso Negativo é estar diante de um padrão, e não reconhecê-lo... Por exemplo, não perceber o tigre, e ‘acreditar’ tratar-se meramente do vento... Somente muito recentemente, aprendemos a lidar com fenômenos complexos, multi-variáveis, probabilísticos, caóticos... Sempre que tomo um taxi faço a experiência, e o gentil taxista após uma breve apresentação, e definido o itinerário, dispara: ‘o clima está louco’... Ao que trato de responder, com um sorriso nos lábios, ‘não, o clima É louco’... A troposfera é um sistema caótico... O gui de minha visita a ‘la Huaca de la Luna’, bem que tentou alegar que os Mochicas conheciam a corrente de Humboldt, o fenômeno do El Niño, mas objetei demonstrando que pelo número de cabeças cortadas e por seu desafortunado destino, fica patente que nossos amigos peruanos não poderiam sequer conhecer o ciclo das chuvas – dominado amplamente por qualquer criança matriculada na quarta série...
Pois viajamos como exploradores, vítimas e inquilinos, de nossos próprios cérebros... O Falso Positivo pode ter representado vantagem em nosso passado evolutivo, mas pagamos um preço muito elevado por nossos superstições, umas mais do que outras... E dispomos da Ciência, de forma que podemos racionalizar nossas vidas, podemos evitar este dispêndio de energia... Mas a questão pode ser bem mas dramática, porque podemos evitar a mortalidade infantil, viver mais, sermos mais justos, evitarmos o assassinato de pessoas, por causas meramente supersticiosas....
Estamos fadados às superstições, uns cérebros mais do que outros, assim como ao animismo e o antropomorfismo... Por isso vemos animais em constelações, e deuses que pensam e agem como homens – caprichosos, cruéis e rabugentos...
De forma que existe uma tendência a acreditar primeiro – Falso Positivo – para depois nos esmeramos nas explicações... E tais crenças, e suas respectivas explicações, normalmente estarão calcadas em causalidades de primeira ordem, onde uma causa é suficiente e necessária para provocar um efeito, dependente desta causa... ‘Aquele casal se separou... Faltava deus em suas vidas...’... Mas existem melhores explicações para isso, complexas, multi-variáveis... Onde um cérebro pouco iniciado no conhecimento científico vê ‘mistério’ existe apenas complexidade... Para uns, solucionar um sistema com duas equações e duas varíaveis, poderá ser uma tarefa hercúlea, enquanto para outros será um passatempo...
Quem nada sabe, em tudo crê – Jam Neruda
Um vez deflagrada a crença, começa um ciclo de reforço e confirmação de tal crença... A personalidade e suas dimensões, desempenhará um papel muito forte em estabelecer a força deste ciclo... Existem pessoas mais ou menos suscetíveis à novas experiências, a obsessões, medos, etc...
Outro ângulo para enfrentar a questão, nos mostra que para ‘criar’ superstições basta um protagonista, uma anedota, e um interessado ‘crente’... O simples relato de casos, ‘fulano (A) curou sicrano (B)’, em geral, só precisa de certa notoriedade e alguns testemunhos casuais, para viajar nas ondas do esoterismo’... Entender, saber, exige formação, estudo abnegado, e muita vontade de acertar... ‘Ético, logo cético’... Não é por acaso que convivemos com mais crentes do que pensadores...
Carlos Sherman
Fonte: Shermer Inside
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