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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Sócrates... O Pensador...




Sócrates

Paradoxalmente, Sócrates, um importante crítico dos sofistas, morre perseguido por suas ideias pouco ‘religiosas’, e notadamente ‘sofistas’... Mas esta é outra Estória na História... Quando induzido a retratar-se por questionar o Panteão de Deuses Gregos, fazendo um acordo, e jurando não mais ensinar, Sócrates, fiel às suas convicções, escolhe suas palavras e seu destino...

"Eu predigo-vos portanto, a vós juízes, que me fazeis morrer, que tereis de sofrer, logo após a minha morte, um castigo muito mais penoso, por Zeus, que aquele que me infligis matando-me. Acabais de condenar-me na esperança de ficardes livres de dar contas da vossas vida; ora é exatamente o contrário que vos acontecerá, asseguro-vos (...) Pois se vós pensardes que matando as pessoas, impedireis que vos reprovem por viverem mal, estais em erro. Esta forma de se desembaraçarem daqueles que criticam não é nem muito eficaz nem muito honrosa."
Sócrates

O seu célebre aforismo, ecoa no Panteão dos Grandes Homens:

Só sei que nada sei...

Sócrates morre por suas ideias... E fundamenta, mais do que tudo, a Integridade Intelectual... A importância de Sócrates, no entanto, transcende à nobreza de sua morte... A História do Pensamento, na Antiguidade Clássica, pode ser dividida em Pré-Socrática e Socrática...

Sócrates nasceu em Atenas, entre 469 e 470 a.C.; e viveu e morreu em Atenas, em         399 a.C., com 70 ou 71 anos... Sócrates dizia que sua sabedoria era limitada à sua própria ignorância... Segundo ele, a verdade, escondida em cada um de nós, só é visível aos olhos da razão... Ele acreditava que os erros são consequência da ignorância humana... Nunca se autoproclamou sábio... A intenção de Sócrates era levar as pessoas a conhecerem seus desconhecimentos...

Conhece-te a ti mesmo...
Nosce te ipsum...

Este aforismo grego, segundo a tradição, estaria inscrito nos pórticos do Oráculo de Delfos, originalmente de Pítia, em Delfos, na Antiga Grécia... A frase é atribuída à primeira ‘pitonisa’ deste oráculo, Femonoe... Esta é uma pedra-angular da filosofia de Sócrates e do seu método, a maiêutica... Tudo o que sabemos de Sócrates decorre dos relatos de Platão, e Xenofonte... O oráculo do templo teria proclamado Sócrates o homem mais sábio na Grécia, ao que Sócrates terá respondido com a célebre frase: "Só sei que nada sei"...

"Conhece-te a ti mesmo", nos remeta à reflexão e a problematização dos conceitos morais e culturais, e os dogmas e preconceitos se tornam evidentes... Não reconheço no pensamento de Sócrates, suficiente contraposição às ideias sofista a ponto de torna-los inimigos, ou oponentes... Antes percebo uma mera disputa de espaços, amplificada e confundida, pelos interesses de Platão... Nunca saberemos ao certo, mas podemos conjecturar...

O estudo da virtude se inicia com Sócrates, para quem a virtude é o fim da atividade humana e se identifica com o bem que convém à natureza humana... O homem pelo homem, servindo e sendo útil ao homem... Sócrates acreditava que o melhor modo para as pessoas viverem era se concentrando no próprio desenvolvimento ao invés de buscar a riqueza material...

Convidava outros a se concentrarem na amizade e em um sentido de comunidade, pois acreditava que esse era o melhor modo de se crescer como uma população... Suas ações são provas disso: ao fim de sua vida, aceitou sua sentença de morte quando todos acreditavam que fugiria de Atenas, pois acreditava que não podia fugir de sua comunidade... Acreditava que os seres humanos possuíam certas virtudes, tanto filosóficas quanto intelectuais... Considerava as virtudes o bem mais precioso...

Paradoxos Socráticos:

"A virtude é um conhecimento"...

"Ninguém faz o mal voluntariamente"...
"As virtudes constituem uma unidade"...

"É preferível sofrer injustiça do que cometê-la"

"Jamais se deve responder à injustiça pela injustiça, nem fazer mal a outrem, nem mesmo àquele que nos fez mal"

Notem que Sócrates questiona o livre-arbítrio, e suas ideias precedem a Cristo em 500 anos, e de forma muito mais brilhante, além de original...

Sócrates afirmava que: “Ninguém faz o mal voluntariamente, mas por ignorância, pois a sabedoria e a virtude são inseparáveis”.

Conta-se que um dia Sócrates foi levado junto à sua mãe para ajudar em um parto complicado... Vendo sua mãe realizar o trabalho, Sócrates ‘filosofou’: Minha mãe não irá criar o bebê, apenas ajuda-lo a nascer e diminuindo a dor do parto... Ao mesmo tempo, se ela não tirar o bebê, logo ele irá morrer, e igualmente a mãe morrerá! Sócrates concluiu então que, de certa forma, ele também era um parteiro... O conhecimento está dentro das pessoas (que são capazes de aprender por si mesmas)... Porém, eu posso ajudar no nascimento deste conhecimento... Concluiu ele. Por isso, até hoje os ensinamentos de Sócrates são conhecidos por maiêutica (que significa parteira em grego)....

Sócrates foi discípulo de Anaxágoras e Arquelau... Seu talento logo foi convertido em reputação, tanto é que foi chamado pela Pítia (sacerdotisa do templo de Apolo, em Delfos, Antiga Grécia) de o mais sábio de todos os homens...

Platão afirma que Sócrates não recebia pagamento por suas aulas... Sua pobreza era prova de que não era um sofista... Precursor de Cristo...

Platão considerou que Sócrates foi condenado por questões evidentemente políticas... Por seu lado, Xenofonte atribuiu a acusação a Sócrates a um fato de ordem pessoal, pelo desejo de vingança... O propósito não era a morte de Sócrates mas sim afastá-lo de Atenas... Ao que Sócrates enfrentou com bravura indómita...

A popularidade de Sócrates se espalhava e viajava com suas ideias... Enquanto ele angariava mais e mais discípulos... De graça... Assim, os antigos professores foram ficando irados... Pensavam eles: Como um homem poderia ensinar de graça e pregar que não se precisavam de professores como eles? E mais: Eles não concordavam com os pensamentos de Sócrates, que dizia que para se acreditar em algo, era preciso verificar se aquilo realmente era verdade... Essa é a base do Método Científico e da Ética...

Logo Sócrates começou a colecionar muitos inimigos.

Mas eis que a guerra do Peloponeso estourou, e todos os homens entre 15 e 45 anos de idade foram enviados para lutar... Sócrates, pela sua habilidade, carisma e liderança, foi escolhido como um dos generais... Ao final da guerra, com a intenção de salvar os poucos soldados que ainda estavam vivos, Sócrates ordena que todos voltem rapidamente para Atenas, deixando os mortos no campo de batalha - contrariando uma lei que obrigava o general a enterrar todos os seus soldados mortos, ou morrer tentando... Assim, ao chegar, Sócrates é preso...

Usando toda a sua capacidade de persuasão, Sócrates consegue convencer a todos de que era melhor deixar alguns mortos do que morrerem todos, uma vez que:

Se todos morressem, ninguém poderia enterrá-los...
Bem ‘sofista’, rsrsrsrs...

Desta forma ele consegue a liberdade, e permanece livre por mais 30 anos, quando então é preso novamente, acusado de 3 crimes:
1- Não acreditar nos costumes e nos deuses gregos;
2- Unir-se a deuses malignos que gostam de destruir as cidades;
3- Corromper jovens com suas idéias;
Os acusadores foram: Ânito, Meleto e Lícon...

Ânito - era um líder político, comerciante e rico; seu filho era discípulo de Sócrates, e ria dos deuses e do pai;
Meleto - era um poeta trágico novo e desconhecido... Foi o acusador oficial, e representava a classe dos poetas e adivinhos... Deuses questionados, adivinhos questionados;
Lícon - um retórico obscuro e que teve pouca importância e autoridade no decorrer da condenação... Representava a classe dos oradores e professores de retórica, com interesses comerciais em flagrante conflito com o altruísmo gratuito do réu;

"... Sócrates é culpado do crime de não reconhecer os deuses reconhecidos pelo Estado e de introduzir divindades novas; ele é ainda culpado de corromper a juventude. Castigo pedido: a morte"...

Muito mais útil que Cristo, afinal tinha um propósito ao enfrentar a morte, lutar pela liberdade e pelo livre-pensamento...

Segundo Jean Brun, professor da Universidade de Dijon, e estudioso da vida de Sócrates:

"O processo e a condenação de Sócrates testemunham o perigo que a ignorância faz correr ao saber, que o mal faz correr à virtude... Mas este perigo não é senão aparente, pois, na realidade, é o justo que triunfa dos seus carrascos... Se bem que seja vítima deles, o triunfo de Sócrates sobre os seus juízes data do dia da sua execução."

O tribunal, constituído por 501 cidadãos, o condenou a se exilar para sempre, ou a lhe ser cortada a língua, impossibilitando-o assim de ensinar aos demais... Caso se negasse, ele seria morto... E assim foi...

Após receber sua sentença, Sócrates proferiu:
Vocês me deixam a escolha entre duas coisas: uma que eu sei ser horrível, que é viver sem poder passar meus conhecimentos adiante...  A outra, que eu não conheço, que é a morte... Escolho pois, o desconhecido!!!
E quando chegou a hora:

Mas eis a hora de partir: eu para morte, vós para a vida. Quem de nós segue o melhor rumo ninguém o sabe, excepto os deuses...

Ao se dirigir aos atenienses que o julgaram, Sócrates disse que lhes era grato e que os amava, mas que enquanto tivesse um sopro de vida, poderiam estar seguros de que não deixaria de filosofar... Sócrates então deixou o tribunal e foi para a prisão... Durante estes 30 dias, ele recebeu os seus amigos e conversou com eles... Declarando não querer absolutamente desobedecer às leis da pátria, Sócrates recusou a ajuda dos amigos para fugir... E passou o tempo preparando-se para o passo extremo em diálogos com os seus diletos amigos... Chegado o momento da execução, pouco antes de beber o veneno, Sócrates, de forma irônica e sarcástica (como de costume), proferiu suas últimas palavras:

- Críton, somos devedores de um galo a Asclépio; pois bem, pagai a minha dívida... Pensai nisso!!!

Após essas palavras, Sócrates bebeu o cálice de cicuta (Conium maculatum) e, diante dos amigos, aos 70 anos, morreu por envenenamento... Platão, no seu livro Fédon, assim narrou a morte de seu mestre:

A morte de Sócrates
Depois de assim falar, levou a taça aos lábios e com toda a naturalidade, sem vacilar um nada, bebeu até à última gota.
Até esse momento, quase todos tínhamos conseguido reter as lágrimas; porém quando o vimos beber, e que havia bebido tudo, ninguém mais aguentou. Eu também não me contive: chorei à lágrima viva. Cobrindo a cabeça, lastimei o meu infortúnio; sim, não era por desgraça que eu chorava, mas a minha própria sorte, por ver de que espécie de amigo me veria privado. Críton levantou-se antes de mim, por não poder reter as lágrimas. Apolodoro, que desde o começo não havia parado de chorar, pôs se a urrar, comovendo seu pranto e lamentações até o íntimo todos os presentes, com exceção do próprio Sócrates.
- “Que é isso, gente incompreensível? Perguntou. Mandei sair as mulheres, para evitar esses exageros. Sempre soube que só se deve morrer com palavras de bom agouro. Acalmai-vos! Sede homens!”
Ouvindo-o falar dessa maneira, sentimo-nos envergonhados e paramos de chorar. E ele, sem deixar de andar, ao sentir as pernas pesadas, deitou-se de costas, como recomendara o homem do veneno. Este, a intervalos, apalpava-lhe os pés e as pernas. Depois, apertando com mais força os pés, perguntou se sentia alguma coisa. Respondeu que não. De seguida, sem deixar de comprimir-lhe a perna, do artelho para cima, mostrou-nos que começava a ficar frio e a enrijecer. Apalpando-o mais uma vez, declarou-nos que no momento em que aquilo chegasse ao coração, ele partiria. Já se lhe tinha esfriado quase todo o baixo-ventre, quando, descobrindo o rosto – pois o havia tapado antes – disse, e foram suas últimas palavras:
- “Críton (exclamou ele), devemos um galo a Asclépio. Não te esqueças de saldar essa dívida... Pensai nisso!!!”
- "Assim farei!", respondeu Críton. Vê se queres dizer mais alguma coisa. A essa pergunta, já não respondeu. Decorrido mais algum tempo, deu um estremeção. O homem o descobriu; tinha o olhar parado. Percebendo isso, Críton fechou-lhe os olhos e a boca.
“Tal foi o fim do nosso amigo, Equécrates, do homem, podemos afirmá-lo, que entre todos os que nos foi dado conhecer, era o melhor e também o mais sábio e mais justo."
[Fédon 117e-118c]

Sócrates costumava caminhar descalço e não tinha o hábito de tomar banho... Em certas ocasiões, parava o que estivesse fazendo, ficando imóvel por horas, meditando sobre algum problema... Certa vez o fez descalço sobre a neve, segundo os escritos de Platão, o que demonstra o caráter lendário da figura Socrática...

Estrabão conta que, após uma derrota ateniense em que Sócrates e Xenofonte haviam perdido seus cavalos, Sócrates encontrou Xenofonte caído no chão, e carregou-o por vários estádios, até que a batalha terminou...

No Fédon, de Platão, Sócrates parece considerar a imortalidade... Quando Sócrates foi condenado à morte, comentou alegremente que no outro mundo poderia fazer perguntas eternamente sem ser condenado a morrer, porque seria imortal...

Sócrates, como já dito, provocou uma ruptura sem precedentes na história da Filosofia grega, separando filósofos entre pré-socráticos e pós-socráticos... Enquanto os filósofos pré-Socráticos, chamados de naturalistas, procuravam responder à questões do tipo: "O que é a natureza ou o fundamento último das coisas?" Sócrates, por sua vez, procurava responder à questão: "O que é a natureza ou a realidade última do homem?" Bem sofista, rsrsrs... Vide Protágoras...

"O homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das coisas que não são, enquanto não são."

Sócrates se assemelhava aos sofistas, embora Platão afirme que Sócrates não recebia pagamento por suas aulas... Para Platão, sua pobreza era prova de que não era um sofista... Evidentemente que não... Seu voto de pobreza era uma opção pela integridade, o que não necessariamente elimina a hipótese de Sócrates de parecer muito mais com os sofistas, do que a Platão lhe interessa aceitar... Para os sofistas tudo deveria ser avaliado segundo os interesses do homem e da forma como este vê a realidade social (subjetividade), e relativizando todas as regras morais, as proposições e debates políticos... Alegando que tudo dependeria de uma argumentação eficiente... Neste particular, existe uma diferença clara com o pensamento de Sócrates, que mesmo entendo a relatividade de muitos fenômenos, trata de buscar algumas leis universais, úteis e necessárias...

No entanto, contrariamente aos sofistas, Sócrates procurava um fundamento último para as interrogações humanas:
"O que é o bem?"

"O que é a virtude?

"O que é a justiça?”

Sócrates contribuiu para que os sofistas entendessem a importância das evidências... O que colocou Sócrates em destaque foi o seu método e sua atitude, e nem tanto as suas doutrinas... Sócrates baseava-se na argumentação, insistindo que só se descobre a verdade pelo uso da razão... O seu legado reside, sobretudo, na sua convicção inabalável de que mesmo as questões – aparentemente - mais abstratas admitem uma análise racional...

O método socrático consiste em uma técnica de investigação filosófica, que faz uso de perguntas simples e quase ingênuas que têm por objetivo, em primeiro lugar, revelar as contradições presentes na atual forma de pensar do aluno, normalmente baseadas em valores e preconceitos da sociedade, e auxiliá-lo assim a redefinir tais valores, aprendendo a pensar por si mesmo...

Considero esta metodologia particularmente interessante, por levar o debatedor a formular as suas próprias respostas... E, portanto, ‘parir’ a resposta... Se fornecemos as respostas, elas não serão assimiladas - mesmo quando há plena concordância – como seriam, se fossem originadas na mente do aprendiz ou debatedor...

Sócrates também duvidava da ideia sofista de que a virtude possa ser ensinada às pessoas... Acreditava que a excelência moral é uma questão de inspiração e não de parentesco, pois pais moralmente perfeitos não tinham filhos semelhantes a eles... Mas não explicou o que seria a ‘inspiração’... Isso talvez tenha sido a causa de não ter se importado muito com o futuro de seus próprios filhos... Talvez Sócrates estivesse tateando – por observação de padrões – a Genética, e a Neurociência... Quem sabe?

Sócrates, em gesto de humildade, frequentemente dizia que suas ideias não eram próprias, mas de seus mestres, entre eles Pródico e Anaxágoras [de Clazômenas]...

Socrátes afirmava que “Ninguém faz o mal voluntariamente, mas por ignorância, pois a sabedoria e a virtude são inseparáveis”... Teria sido fantástico dialogar com Sócrates da altura do conhecimento que dispomos hoje... Teríamos a Genética e a Neurociência, para validar a primeira parte da proposição... Alias – e relativizando - nada é plenamente voluntário, embora pareça... E sim, virtude e conhecimento são inseparáveis... Também comparto com Sócrates interesse em ajudar e brindar conhecimento... E tenho percorrido este caminho... Ajudado por homens notáveis, como ele... Simplesmente: SÓCRATES... Sua atitude e caminho, como precursor inconteste do Método Científico, e incomparável guardião da Integridade Intelectual, foram e ainda são ‘inspiração’ para o melhor que o Homem há produzido...

Carlos Sherman

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