Fracassa
suicídio homeopático de céticos britânicos...
Precisamente às 10:23 da
manhã do último dia 30 de janeiro, mais de 400 céticos britânicos ingeriram
quantidades maciças de remédios homeopáticos buscando uma “overdose” que, se a
homeopatia funcionasse, deveria ter causado sérias consequências. Felizmente,
como se queria demonstrar, todos saíram ilesos deste protesto público contra a
venda de “remédios” homeopáticos que não possuem qualquer efeito comprovado
além do placebo. Uma overdose de pílulas de açúcar não tem efeito maior do que
uma bala. De doce, claro.
“Pensamos que não se deveria
vender pílulas de açúcar a pessoas que estão doentes. A homeopatia nunca
funciona melhor que um placebo. Os remédios são tão diluídos que não há nada
neles”, declarou Michael Marshall, da Sociedade de Céticos de Merseyside. E
nestas declarações, Marshall estava incrivelmente apenas repetindo as
declarações de quem vende tais produtos e mesmo daqueles que os receitam.
Explica-se.
Um dos principais alvos da
campanha 10:23 foi a cadeia de farmácias “Boots”, que oferece produtos
homeopáticos em suas prateleiras lado a lado com remédios que realmente possuem
algum efeito. O mais impressionante é que há meses o principal responsável pela
rede de farmácias, Paul Bennett, já havia admitido que os produtos são vendidos
porque são populares, e não porque sejam efetivos no tratamento de qualquer
doença.
“Não tenho nenhuma prova de
que esses produtos funcionam. Trata-se da livre escolha do consumidor, e um
grande número de nossos clientes crêem que são eficazes”, declarou ao Comitê de
Ciência e Tecnologia à Câmara dos Comuns em Londres. A rede de farmácias parece
feliz em respeitar a livre escolha de seus clientes quando isto significa
lucrar vendendo produtos que não funcionam.
Em resposta ao protesto
cético contra a venda de produtos inócuos a consumidores incautos, mesmo o
Conselho de Homeopatas da Nova Zelândia já foi forçado a reconhecer que seus
produtos não contêm “substâncias materiais”. A porta-voz do conselho, Mary
Glaisyer, admitiu publicamente que “não resta nenhuma molécula da substância
original”. É reconhecidamente apenas água ou açúcar. Vale repetir, como Bennett
reconheceu, sem nenhum efeito comprovado.
Mesmo antes da demonstração
cética, um episódio no início de dezembro de 2009 que poderia ser trágico
terminou cômico quando a filha do músico Billy Joel, Alexa Ray Joel, tentou se
suicidar tomando uma overdose de remédios. O detalhe é que as pílulas eram de
“Traumeel”, um produto homeopático para tratar dor nas articulações. Alexa Ray
Joel ligou para a emergência e foi rapidamente tratada, mas ainda que não o
fosse “nada iria acontecer porque não há nada [no produto]”, disse o Dr. Lewis
Nelson, toxicologista do Centro Médico da Universidade de Nova Iorque. Mal
sabia ela que estava comprovando a ineficácia dos produtos homeopáticos.
Acima, fábrica de remédios
homeopáticos. Não é uma brincadeira, a
fotografia vem da Washington Homeopathic Products. É apenas água [com água - nota minha].
A ausência de qualquer
efeito, mesmo em “overdoses” como as ingeridas pelos céticos britânicos, pode
soar mesmo benéfica para alguns, já que pelo efeito placebo muitos dizem
sentir-se melhores. Tentativas de suicídio que terminam cômicas… que mal haveria
na homeopatia? Isto é, além de sustentar uma indústria multimilionária feliz em
cobrar altos valores por produtos sem qualquer eficácia real?
Resulta que há prejuízo
social muito concreto, incluindo sofrimento e mortes desnecessárias nada
engraçadas.
Como relata o jornalista
Simon Singh, homeopatas podem oferecer aconselhamento de saúde claramente
nocivo. Questionados sobre se pais deveriam imunizar seus filhos com a vacina
tríplice, de 168 homeopatas consultados, 75 responderam mas apenas dois indicaram
a vacinação – os
demais estavam ocupados em seu comércio
[nota minha]. “É evidente que a enorme maioria dos homeopatas não
encoraja a imunização”. Aconselhamentos infelizes como estes contribuíram para
o ressurgimento de surtos de sarampo em vários países, incluindo o próprio
Reino Unido, onde recentemente os casos passaram de dezenas para milhares.
Vale notar que o surgimento
destas milhares de crianças afligidas pela doença muito real e facilmente
prevenível está relacionado também com um estudo de 1998 extremamente
deficiente supostamente associando a vacina tríplice ao autismo. Andrew
Wakefield, autor do trabalho original que espalhou medo e contribuiu para
reduzir o número de crianças vacinadas, foi recentemente julgado pelo Conselho
Geral de Medicina britânico como tendo agido de forma “desonesta e irresponsável”,
com “notório desprezo” às crianças que foram sujeitos de sua pesquisa.
Seria cômico se não fosse
trágico: não só seus resultados não puderam ser reproduzidos por ninguém,
havendo indicações de que Wakefield os fraudou. Também se descobriu que o
médico estava em verdade tentando patentear sua própria vacina tríplice
alternativa, além de ser pago para depor em um julgamento defendendo a ligação
da vacina tradicional ao autismo, com algumas das crianças em seu estudo sendo
filhas dos mesmos pais envolvidos na ação judicial.
Tudo indica que o suposto
médico contra as vacinas queria apenas vender suas próprias vacinas. A saúde
pública, o bem-estar de milhões de crianças não foi sua principal preocupação,
e como consequência, a taxa de imunização caiu e mais de mil doentes ao ano
surgiram onde antes surgia apenas um punhado.
A vacina tríplice é segura e
múltiplos estudos independentes da Polônia, Dinamarca, Finlândia, o próprio
Reino Unido e Japão provam que e não possui qualquer relação com o autismo – no
Japão, a tríplice foi interrompida após 1993, sem qualquer feito sobre os
índices de autismo.
Não muito diferentes de
Wakefield, as farmácias que produzem e vendem produtos homeopáticos não são
iniciativas corajosas contra as grandes indústrias farmacêuticas. Ao invés, a
indústria homeopática está mais do que feliz em lucrar com aquilo que não
possui efeito comprovado, e reconhecidamente não possui qualquer substância
ativa. A medicina alternativa é em grande parte apenas uma forma alternativa de
lucrar com doentes sem esperança.
O que só se torna mais
revoltante nos casos em que tais doentes podem encontrar esperanças concretas
de prevenção e cura na medicina “convencional”. Indo desde a vacinação, um dos
mais poderosos recursos médicos a controlar e erradicar moléstias da paralisia
infantil à varíola, até casos como o de Daniel Hauser, felizmente curado do
câncer pela medicina, ou o de Gloria Sam, infelizmente morta através da
homeopatia.
Nada cômico.
Fonte: Ceticismo Aberto
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