Por outro
ângulo...
Quando cessam os
argumentos em um debate aberto sobre ‘crenças’, o lado dogmático sempre escolhe
um entre dois caminhos: 1. A disputa eloqüente e agressiva, baseando-se apenas
no seu fundamento; 2. A alegação de que ‘você não sente’, ‘você não tem fé’...
Colocando o tema
sobre outra perspectiva, lembro que os ‘deuses e as crenças vieram de livros
ditos sagrados’... Mas como tais livros foram acreditados como sagrados? ‘Bom, são
sagrados porque os deuses disseram que são’... Isso constitui um argumento
circular, e poderíamos encerrar a discussão por aqui, sendo então que, nada existe a
ser discutido... Não existe objeto... Isso porque o ‘sagrado’ é indispensável
para ‘sagrar’ um deus como deus... Se não podemos ‘sagrar’ o ‘sagrado’, senão
por um deus, como ficamos? Em círculos, e correndo atrás do rabo... Assim não podemos ir a nenhuma parte...
Outro exemplo de
argumento circular, ou absurdo, que presenciei enquanto estive no Irã, em uma
de minhas 7 viagens ao mundo persa; foi quando o Aiatolá Ali Khamenei conclamou
que ‘todos aqueles que querem discutir o relaxamento da pena de morte devem ser
executados’... De forma mais suave, sinto como se, por dispor-me a entender a ‘crença
na crença’, estivesse sendo sentenciado a ser ‘insensível’... Executado em minha sensibilidade... Na verdade são temas
bem distintos como tratarei de ‘demonstrar’, e não são de nenhuma forma 'mutuamente exclusivos'...
Tipicamente,
costumo responder a esta questão de ‘você não sente’, lembrado aos ‘crentes’,
que enumerem
qual dentre os seguintes nomes [com os quais compartilho sentimentos e idéias], ‘não sentem’ ou ‘não pensam’: Drummond, Pessoa,
Mário Quintana, Neruda, Borges, Vargas Llosa, Garcia Marques, Picasso, Da Vinci, Humberto Eco,
Jorge Amado, Chaplin, Caetano Veloso, Chico Buarque, David Gilmour, John
Lennon? Acho que fica fácil perceber que o sentimento não anula o pensamento e
vice-versa...
O conceito
filosófico de ‘Reductio Ad Absurdum’ (latim), ou 'redução ao
absurdo', tem origem grega;
e significaria que podemos reduzir um conjunto de proposições, até chegar a uma ‘redução
ao impossível’... Este conceito foi muito utilizado por Aristóteles...
Também é conhecido como argumento ‘apagógico’, ou ‘reductio
ad impossibile’ ou, ainda, ‘prova por contradição’... Trata-se de uma argumentação lógica e na qual são assumidas uma ou mais hipóteses e, a partir destas, derivamos
até uma consequência dita ‘absurda’ ou ‘ridícula’, e então podemos concluir que
a suposição ou proposição original deve ser falsa... Vale-se da ‘Lei da Não-Contradição’,
onde ‘uma declaração não pode ser concomitantemente verdadeira e falsa'... Também
podemos lançar mão da ‘Lei do Meio Excludente’, onde 'uma sentença não deve ser
igualmente verdadeira e falsa'...
Há uma concepção equivocada de que o ‘Reductio Ad Absurdum’ simplesmente denota um ‘argumento bobo’, o que
seria por si só, uma ‘falácia lógica’... Na realidade, uma ‘redução ao absurdo’
apropriadamente estruturada constitui um argumento válido e, portanto, uma
prova ou demonstração cabal...
Examinemos, pois,
à luz do ‘Reductio Ad Absurdum’ as seguintes proposições:
A - ‘A Bíblia é
um livro sagrado porque contém verdades';
B – ‘Deus é
verdadeiro porque a Bíblia o descreve como verdadeiro’;
Tudo bem até
aqui? Acho que sim... A Bíblia é sagrada porque tem autoridade para tal, dizendo apenas a verdade, e Deus
é Deus porque a Bíblia diz que ele é Deus... Como a Bíblia está certa, Deus
deve ser Deus mesmo, certo?
Então temos:
A - ‘A Bíblia é
um livro sagrado porque contém verdades’;
B – ‘Deus é
verdadeiro porque a Bíblia o descreve como verdadeiro’;
Mas:
C1 – ‘A
Bíblia diz que a Terra é plana, a Terra não é plana, pela Geologia, pela
Geografia, pela Astrofísica, et coetera’;
C2 – ‘A
Bíblia diz que a Terra está no centro do universo, e que foi criada antes do Sol
e das demais estrelas, e não é verdade, pela Astrofísica, Física Nuclear,
Química, et coetera’;
C3 – ‘A
Bíblia diz que a Terra tem um pouco mais do que 6.000 anos, e isso não é
verdade, pela Geologia, pela Astrofísica, Arqueologia, História, et coetera’;
C4 – ‘A
Bíblia diz que o Homem [assim como todos os demais animais, insetos, invertebrados, microrganismos] foi criado por Deus diretamente, sem etapas
intermediárias, há 6.000 anos, e sabemos que não é verdade pela Genética,
Biologia, Neurociência, Antropologia, Paleontologia, et coetera’;
C5 – ‘A
Bíblia diz que a mulher foi criada da costela do homem, e sabemos que não é verdade,
pela Genética, Biologia, Neurociência, Antropologia, Paleontologia, et coetera’;
C6 – ‘A
Bíblia diz que TODAS as doenças são possessão demoníaca, e sabemos que não é
verdade pela Medicina, Genética, Biologia, Neurociência, et coetera’;
Então, não apensas por
uma contradição (‘C’), mas por 6 contradições acachapantes, podemos dizer que a proposição ‘A’ está errado,
ou seja, ‘‘A Bíblia é um livro sagrado porque contém verdades’... Ou seja, a
Bíblia contém muitas falsidades ou erros, de forma que não podemos reconhecer
sua autoridade e o seu ‘sagrado’, por conter verdades... E logo, a proposição ‘B’, de que ‘Deus é verdadeiro porque a Bíblia o descreve como verdadeiro’, também não se sustenta, sem 'A'... Então
significa que ‘a Bíblia não é suficiente para descrever a existência de Deus’...
Sem contar que, quem ‘supostamente’ protagoniza a Bíblia é Deus, ou o seu filho, que também é ele mesmo (!?!)... E como acabamos de
demonstrar, em 6 questões ESSENCIAIS para a vida, a Bíblia está completamente
errada...
Logo, antes de adotar uma posição arrogante sobre sua crença, seja ela qual for, esteja ciente de que nada sustenta sua crença além da sua vontade, sua fantasia, ou a fantasia da cultura da qual você faz parte... Pode decorrer também de caprichos, interesses, mas não será um argumento racional... Sobre a racionalidade 'vs' a sensibilidade, acho que também ficou bem claro não haver a mínima relação...
Logo, antes de adotar uma posição arrogante sobre sua crença, seja ela qual for, esteja ciente de que nada sustenta sua crença além da sua vontade, sua fantasia, ou a fantasia da cultura da qual você faz parte... Pode decorrer também de caprichos, interesses, mas não será um argumento racional... Sobre a racionalidade 'vs' a sensibilidade, acho que também ficou bem claro não haver a mínima relação...
Crer não é
nobre... É frágil, desesperado... Vazio...
Finalmente, sim,
discutir crenças envolve temas objetivos; como ficou demonstrado... Envolve
Física, Astrofísica, Astronomia, Química, Biologia, Genética, Antropologia,
Paleontologia, Geologia, Medicina (Fisiologia, Endocrinologia, Neoruologia, et coetera),
Neurociência Cognitiva, História, Geografia, et coetera...
Carlos Sherman
O milagre não é
dar vida ao corpo extinto,
Ou luz ao cego,
ou eloqüência ao mudo...
Nem mudar água
pura em vinho tinto...
Milagre é
acreditarem nisso tudo!
Mário Quintana
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